A vontade de chegar logo quase cegou os olhos do casal para a estonteante vista da baía do Guajará e o belo por do sol que havia como decoração. Cruzaram numa embarcação diferente, apelidada pelos moradores de Belém de "pô-pô-pô" devido o barulho típico do motor. No início da viagem, inclusive, entenderam logo o porquê do apelido, mas só notaram mesmo o quão barulhenta foi a viagem quando o motor foi desligado, tamanho o alívio para os tímpanos. Após desembarcarem, um ônibus os aguardava próximo ao porto com destino a uma pequena comunidade ribeirinha que despertava o interesse dos dois pelo fato de lá não haver energia elétrica, televisão, e/ou apetrechos "urbanizantes" do tipo. E para quem veio de Porto Alegre passar as férias na Amazônia pelo exotismo, aquele programa os excitava e muito.
Desceram num ramal*, só os dois. Já estava quase na hora das 18 quando sentiram um estranho frio no espinhaço. Um olhou para o outro, e sem falar nada continuaram. 18h em ponto o relógio dele apitou. A hora do remédio teria de esperar um pouco até chegarem ao alojamento. Pelo caminho, só mata os acompanhava de ambos os lados. Durante a andança reparavam que as árvores maiores ficavam mais ao extremo nos flancos enquanto uma vegetação densa, fechada e aparentemente homogênea faziam uma espécie de muro verde para caminhos brancos encardidos e paralelos, entrepostos por uma espécie de pentelho verde demarcando nitidamente um caminho forjado por pneus. Ela, decoradora, se encantou por um tronco à beira do caminho, pois poderia servir de encantadora mobília para uma casa naquela região equatorial. Depois de andarem bastante, ele resolveu ver quanto tempo já haviam caminhado. Para a surpresa dele, ainda eram 18h. E, mesmo sabendo que o celular estava sem rede, resolveu confirmar a hora. Para o espanto dele, também eram 18h ainda. Ela também olha a hora no celular: 18:00. Frio na barriga. Nas duas.
Uma angústia começou a sambar no peito dos dois. Agudo. Um grito. Uma árvore. Uma possível mobília. A mesma árvore por onde haviam passado estava novamente diante deles. O que era virtualmente impossível até mesmo porque eles estavam caminhando a quase meia hora numa linha reta. Era improvável terem voltado. Eles, desesperados, sem combinar nada um com o outro resolveram correr. E correram. E correram. Correram por um caminho melancolicamente familiar, e novamente chegaram à mesma árvore. Ela começou a gritar. Ele, psicanalista mais ou menos experiente, teve vontade de bater na cara dela mas preferiu pedir calma. Ele precisava pensar. Ela precisava gritar.
Nesse momento, ele lembrou do que o amigo paraense havia falado a respeito dos ramais daquela região. "Como vocês são sulistas é melhor virem no barco das 16h, porque assim vocês caminharão no fim da tarde e não tostarão. Só tomem cuidado pra não entrarem depois das 18h, porque a mata se fecha", recomendou o amigo em tom de brincadeira, avisando ainda que depois das seis da tarde os guias da mata não gostam de visitas sem autorização. Naquele caminho fechado e transbordando de desespero, ele parou, e quando ela chorando gritava para ele falar alguma coisa o gaúcho notou um assobio agudo de uma ave e cada vez mais crescente. "Puta que pariu, agora todas as lendas da Amazônia resolveram sair dos livros didáticos?", pensou ele. Na mata (fechada), o choro, o desespero e a agora a Matinta Perera.
Continua na próxima sexta-feira.
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* Ramais são caminhos quilométricos que ligam pequenas comunidades, ribeirinhas ou não, a estradas viscinais.
16 comentários:
Estranho, caso paranormais tem uma origem diversa, mas sempre tem uma lenda que explica o motivo do caso...
Fique com Deus, menino Eraldo.
Um abraço.
Caraleooooooooo!
Que texto intrigante!
Puta que o pariu, como você é detalhista!
Perfeito!
Vê se manda logo a continuação!
Abraços!!!!!
Nossa, me embrenhei nessa mata também. De um certo desespero constatar que eles ficaram perdidos.
BeijooO'
ansiosa p ver a continuação!
perfeito o texto
um grande beijo
Opa, gostei que me lambuzei! Já quero mais, quero mais!
\o/
Beijos, lindão!
ℓυηα
Dá pra imaginar cada detalhe da "saga"! Quais serão as cenas dos próximos capítulos???
C-U-R-I-O-S-A
Bom fds!!!!
Nossa!!! Envolvente demais!!
Menino, vc não perde detalhes!!!!
Beijos.....
isso nunca aconteceria comigo, pq jamais entraria na selva a noite, rs
beijo!
Oi querido, muito boa sua visita e passar por aqui melhor ainda...
Hoje postagem somente no: http://fleshspriscillamarfori.blogspot.com/
B-Jos. doces para você e sorrisos para seu dia!
=)
Até mais ler Eraldo...
Putz, isso daria um ótimo filme... Muito bom, de verdade. Beijo.
Ai que medo...
Já disse que você é ótimo cronista e novelista?
Bjcas
Rossana
o.O tenho saudade de andar no barquinho pô-pô-pô nas férias,dias felizes a minha sorte foi que nunca consegui essa proeza de me perder em algum lugar assim.
Bom,continua a história tá bem legal emocionante,nossa q malzinho vc foi com os dois.xD
Ai, Eraldo, fiquei aflita, também quis sair, gritar, me livrar daquela mata.
Volto pra ler mais na sexta que vem.
Beijo!
Daniel: Também achei mui estranho meu caro... rs abs!
Rick: Caraaaaleooooo.. valeu véio. abs!
Valéria: Né que dá medo? rss bjs!
Kelly: Eu também. bjocas!
Luna: O que você pede que eu não faço? bjs!
Jamylle: Eu também! Bjs!
Suzana: Pensa que é só mulher que tem esse dom? rs bjs!
Antônio: Muito obrigado. Passo já lá!
So Sad: Nunca diga nunca rsrs bjs!
Priscila: Você é sempre linda! bjs!
Nini C: E num é? E acho que não assistiria. Geralmente eu não assisto filmes assim porque tenho medo rs bjs!
Rossana: Assim você vai fazer eu gamar de verdade. bjs no batom!
Ananda: É sempre ótimo ter você por aqui. bjs!
Alline: Eu também fiquei aflito quando escrevi. Que bom que partilhou isso comigo. rs bjs!
Parabéns pelo texto.
Fiquei ainda com mais saudade de Belém!
Beijos
Interessantíssimo! Tu é mal heim, guri, por que fazes essa maldade justo aos porto alegrenses? Vou ler a continuação, tomara que as coisas melhorem!
Um abraço!
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