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segunda-feira, 30 de junho de 2014

ÚLTIMA PAULINISSE - Derradeira parte de um mosaico inacabado

Este blog nunca vai sair do ar, se depender de mim, mas não mais postarei textos novos aqui, salvo na hipótese de eu conseguir publicar um livro com algumas das postagens contidas neste cantinho que há cinco anos é minha válvula de escape para o infinito. Não lembrava, mas quando criei este espaço, na primeira postagem eu disse que ele a realização de uma meta pessoal estabelecida no final do ano anterior. Eu descontinuo as postagens mais ou menos pelo mesmo motivo. Tenho vontade de publicar algo em papel e nada melhor para começar essa vida do que aproveitar o que já produzi.

Foram cerca de 71 mil visualizações nessa meia década. Não significa que cada pessoa que abriu o blog leu um texto todo (tão pouco se gostou), mas é alguma coisinha. Quando eu tinha tempo e disposição pra ser um blogueiro mais ativo eu consegui uma média de 3 mil visualizações/ mês e encerro com menos de um terço disso, um dos motivos pelos quais tomei essa decisão de parar. Se eu não tenho como alimentar regularmente nem como divulgá-lo como se deve, vou continuar publicando aqui pra quê? Se eu quisesse escrever só pra mim e meus amigos mandaria os textos por email ou registraria só no meu PC. Óbvio que criei blog pra que muitas pessoas leiam as porcarias que escrevo.

Eu paro de postar, mas não o tirarei do ar.  Aqui eu expus as minhas entranhas, minhas confidências mais profundas, e minhas loucuras mais desnudas. Também conquistei verdadeiras amizades no mundão da blogsfera. Por isso, enquanto o blogspot existir esse canto existirá.Em breve, além de tentar publicar alguns desses textos pretendo criar um blog só pra contos eróticos e blogar crônicas no site da organização onde trabalho. Darei um jeito de colocar nesse próprio post aqui no futuro os links para vocês conferirem. Também tenho em mente alguns argumentos para romances. "Vamu vê" no que dá.

SOBRE O TÍTULO E PROCESSOS
Como falei em algum post da vida, “Eraldo e suas paulinisses” é um neologismo que brinca com meu nome composto. É legal que o “paulinisse” desobedeça a norma gramatical. Se fosse seguir a “ordem” seria “paulinice”, mas a este cafofo literário aqui jamais quis se enquadrar em regra alguma e enquanto laboratório contém muitos erros de ensaio. Quando re-leio sempre edito uma coisa aqui e outra ali, mas ainda há muitas falhas de concordância, de ortografia, inadequações estéticas. Contudo, como valorizo processos, esses registros com "erros" não me são motivo de vergonha, e sim prova de que a gente muda o tempo todo e às vezes consegue aprender algo. E se noto equívocos é porque alguma coisa assimilei dessa maldita arte de escrever.

Aqui estão registrados textos, inclusive, muito ruins, outros bons, outros "marromenu", ou seja, fica muito do pior e do melhor de mim. Jamais abandonarei minhas Paulinisses e nem deixarei de ser um mosaico de eus, porque pra mim isso é muito mais que um título e um subtítulo. É princípio. Ninguém é a mesma coisa sempre e deixamos uma assinatura particular em cada um de nossos gestos. Esse blog me ajudou a aprender a sobreviver nesse mundo através da escrita. Pretendo continuar fazendo isso de leso que sou.

Aqui uma pequena seleção nos meus textos prediletos dos principais Eus deste mosaico:





Eu Romântico: Twittando

Eu Existencialista: Mosaico de eus em debate



Eu Religioso: Círio de Lucidez

Eu Poeta: Mel e Limão




quinta-feira, 26 de junho de 2014

O FanTáSTicO mUnDO de PeDRo

Fotografia do Pedro feita por Thiago Araújo
É um menino diante de mim, até as palavras mágicas "Bora brincar?" com a voz mais gostosa do mundo. Depois disso ele é qualquer coisa, em qualquer lugar. O impossível brinca de ser. Pedro torna-se o bravo dragão guerreiro e eu um monstro com corpo de touro e rosto de cegonha. Lutamos. Bravamente. Aqueles outrora pequenos braços me acertam e empurram longe. Em seguida aqueles pés alguns segundos antes diminutos me chutam. Eu dou gritos de dor (essa é a ordem). Caio e imediatamente meu corpo vira pista de corrida para o carro pilotado por ele avançar. Cada contorno da minha perna vira um obstáculo, e derramando algumas gotas de saliva o motor ronca, os pneus cantam em freadas bruscas. O carro vai e volta. Já que estou mesmo deitado ele pega um cinto, envolve em meu pescoço. Súbito ele tem em mãos a rédea para controlar o dragão. Meus braços viram asas e sou obrigado a cuspir fogo contra os inimigos desafortunados que cruzam nosso caminho.  Minha barriga está pra cima, mas ela é a costa selada de um cavalo de fogo e o enredo oscilante, desatrelado de coesão e outras chatices lógicas são ditados pela boca sempre sorridente a decorar as mais diversas expressões de dar inveja a qualquer jogador de RPG. O cavalo aqui então corre, pula, para, anda bem devagar pra não chamar atenção, e até morre – com direito a choro e tudo. Enquanto estou nesse estado de “Bora brincar?” a realidade é como uma massa de modelar nas mãos do Pedro. Eu sempre canso antes dele, mas uma hora ele se entrega também. Deita no meu colo no único momento da brincadeira que me sinto invencível o suficiente para proteger o mocinho. Ele fecha os olhos quase sempre junto comigo. Enquanto sonho coisas desamarradas e anacrônicas chego perto do nível dele, finalmente. Até a hora de acordar, porque aí só um de nós faz isso plenamente. E não sou eu. Daí eu continuo levando minha vida normalmente, assim, imaginado o que viver. E ele vivendo o que imagina.

quarta-feira, 11 de junho de 2014

Sobre andar descalço

Ele se sentia oprimido com as sandálias e sufocado pelos sapatos. Gostava mesmo era de sentir os pedregulhos empurrarem pra cima a palma do pé, ter contato direto e sem intermediários com a perfeição dos defeitos do chão. Sentia-se mais honesto consigo mesmo pisando em algo sujo, quente ou macio e agradável do que pagar para fazer propaganda de calçados famosos.

Mas ele não podia. Os espinhos, o calor, a pobre sujeira, a santa higiene (salve salve), a boa educação, a ordem da mãe, as regras da empresa, tudo era motivo pra não andar descalço. Ele aceitou essas desculpas chuviscadas durante a vida toda, mas sempre dava um jeito de viver a própria liberdade sob si quando dava, quando não era convencionalmente proibido.

Certo dia ele voltava pra casa trilhando o mesmo caminho de sempre. Vinha pensando na vida, cabisbaixo, e reparou nos próprios passos, cada vez mais curtos. Não era mais a sandália que ele enxergava, mas sim amarras em seus calcanhares de pé a pé. Olhou ao lado, pro outro, pra frente, pra trás, olhou de novo e não conseguia mais enxergar calçadas e sim obediência. Correntes. Um pé atrás do outro. Cada pessoa puxava a outra e a outra puxava o um e por aí se ia.

Mas mesmo assim ele não conseguia se libertar a partir da própria base. Tinha vergonha desse negócio de fazer o que quisesse. Até que um dia, ao chegar da rua, deu um passo estranho. Era leve. Sentiu o mesmo peso dos pés de criança, quando procurava as pedras mais salientes indo rumo ao igarapé de Colares, de quando corria solto atrás de uma bola em campos de várzea, de quando lavava os pés e via naquela água suja escorrendo para o ralo todo o resumo do dia. Olhou pra baixo e viu a sandália arrebentada. Jogou ela e o outro par no lixo e ouviu o tintilar do metal quando elas chegaram ao fundo. Ele sorriu. Estava livre.

Desde então ele anda descalço pra onde precisa ir. Todos estranham, mas, se perguntam, diz simplesmente que a sandália arrebentou graças a Deus, ou que paga promessa, ou que tem trauma porque a mãe foi assassinada por um bandido fazendo-a engolir o próprio chinelo. Não precisava de razão para seguir a própria vontade, e sim das desculpas certas.  Quem não tinha intimidade suficiente pra perguntar estranhava não apenas aqueles pés imoralmente desnudos, mas também aquele olhar distante, meio autista e os sorrisos bobos do nada para o nada. Ninguém percebia como ele estava na verdade voando, como nos melhores sonhos de outrora. Com os pés no chão ele se conectava com todo o universo ao seu redor, principalmente com as coisas invisíveis e desimportantes.