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segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

DIANTE DE SI – PARTE 2 DE 3

Como vimos no último Post, Armando foi um universitário militante e combatente. Sempre era aplaudido pelas críticas densas e radicais que fazia contra os grandes veículos de comunicação nos painéis e seminários nos quais era orador. No entanto, cinco meses depois de formado e sem emprego, e, além disso, com a notícia da paternidade não planejada, foi à uma redação de um jornal conservador tentar arrumar o primeiro emprego. Entretanto, a primeira tarefa dele seria escrever justamente sobre um protesto feito pelos ex-colegas de militância reprimido violentamente pelos policiais. Agora, diante do PC, o ideal e o real travam uma dura batalha em sua mente. Ele sua frio. O colega que o acompanhou na apuração o vê há 10 minutos diante da tela com o word aberto e nenhum caractere digitado. “Depois que você começar, o resto fica mais fácil”, aconselhou.

Na verdade, o problema não estava em começar o texto. O problema estava em começar a fazer algo que sempre criticou. Ele sabe. A única forma de conseguir o emprego é escrever meias verdades, pois a linha editorial do jornal claramente repudia atos como o que foi realizado pelo movimento estudantil do qual participou. Após ter uma ideia desesperada mas de repente viável, Armando levanta-se da cadeira e vai até o editor que vai avaliar a matéria escrita por ele. Pergunta se a matéria sairá com sua assinatura. “Não. Em geral colocamos assinatura depois do repórter devidamente contratado”, respondeu. Bingo! Ele escreve a matéria. Fala do ato, fala do congestionamento provocado, fala superficialmente dos argumentos dos estudantes em realizar o protesto e relata o discurso policial hipócrita que afirma ter agido pacificamente. Para não dizer que não falou das flores, ele cita a agressão do policial em uma linha. “Eles devem cortar isso, mas vou colocar mesmo assim”, pensou.

Na verdade, foi fácil escrever o texto. Ele só teve de fazer tudo aquilo que antes dizia que não era para se fazer quando estava com a fala nos auditórios ou empunhando mega-fones. No outro dia a matéria sai publicada. Ele vê os previsíveis comentários dos colegas a respeito da matéria que ele fez - o qual nem teve coragem de ler para não ter mais raiva. Ele ganha o emprego. Mas antes de encarar os colegas de militância para explicar o que ele está fazendo e porquê está fazendo, ele tem de descobrir por si próprio se isso tudo vale realmente à pena. Vai até a casa de um ex-professor repórter num jornal concorrente. Este era um dos poucos que respeitava o movimento estudantil. Quer saber como o professor conseguiu ser um dos mais respeitados jornalistas dos grandes jornais ‘comerciais’ da cidade, dados os ideais que ele partilhava nas salas de aula.

Ao chegar a casa do professor, o impacto. Um dos jornalistas mais respeitados da cidade, com um dos melhores salários, tem uma casa bem mais simples que a sua. É um apartamento pequeno, sem nada luxuoso. Móveis surrados, alguns quadros bonitos mas com a televisão pequena, apesar de ser LCD. O professor fala com ele, mas daqui a alguns minutos nenhuma das palavras do mestre ficará registrada em sua mente. O que marcou mesmo Armando foi ver um jornalista no auge da carreira possuir menos coisas do que o pai, que nem curso superior tem. O professor falava dos primeiros meses difíceis dele na redação e filtros ideológicos quando viu o ex-aluno sair correndo pela porta.

Armando desceu desde o oitavo andar do prédio onde o ex-professor morava pelas escadas. Ele queria muito chorar, mas o choro estava engatado todo na garganta. Ele chegou em casa e não falou com ninguém. Foi direto para debaixo do chuveiro. Ele se sentia sujo. “Como eu fui me vender por tão pouco?”, se condenava. Eis que a mãe bate na porta do quarto. “Armandinho, telefone pra ti. É do jornal”, avisou a coroa. “Vou atender aqui do quarto”, respondeu Armando. Era a chance. “Vou mandar esse jornal pra puta que pariu”, desejou. Ao atender, não era o editor e sim o colega jornalista que o acompanhou.

“O policial denunciado por você foi afastado da polícia pela corregedoria”, disse o colega preocupado (pois PMs costumam 'marcar' jornalistas que 'escrevem demais'). Mas Armando sorriu de felicidade, deixando o colega sem entender. Afinal, Como?! A linha que escrita do policial que agrediu o aluno covardemente saiu?! Ele pega o jornal depois de desligar o telefone. Procura pela linha. Estava lá! A linha saiu! De repente, o outro lado da profissão irradia diante dele. Em tantos atos e palestras para militante ouvir, nunca conseguiu fazer com que uma autoridade canalha fosse ao menos punida. Com uma linha de jornal ele conseguiu fazer algo concreto que não conseguiu em três anos de movimento. Em meio a alegria, chega um sms. “O jornal burguês mais uma vez criminalizou nosso ato”, enviou um colega militante. E agora? Ser ou não ser jornalista de um periódico burguês que, porém, fala mais alto que um palanque? Eis a questão...

Continua...

10 comentários:

byTONHO disse...



"Aguardamos, diria o Paulo Ramos..."

A BARRA vai pesar...!

:o)

Paulo Roberto Figueiredo Braccini - Bratz disse...

sim aguardamos ...

Unknown disse...

E que venha o Fim ....
Beijos & Sorrisos !

Ale disse...

Os dilemas que a gente enfrenta ao longo da vida,

Que venha o final,


**Teu texto me trouxe uma canção de Oswaldo Montenegro: 'quantas mentiras VC condeva, qtas Vc teve que cometer...'


Bjkas

Suzana Martins disse...

ai ai ai...
ansiosa pelo final...

o bicho vai pegar, rsrsrs...

beijos

Mirella de Oliveira disse...

Eraldo,

Em primeiro lugar, muito bem escrito o teu texto. Além disso, é envolvente. Eu fico aqui, ansiosa pro que está por vir. Não deu vontade de parar de ler. Parabéns!
Porém, não entedi algumas coisinhas: (1) como os colegas militantes sabiam que o texto era do Armando se no jornal não saiu com a assinatura dele? (2) ele foi até a casa do ex-professor porque imaginou que seu futuro seria como o dele e supôs que ele era 'bem de vida'? Ou ele queria saber como o professor elaborava seus textos jornalísticos (se seguia as regras do jornal ou suas ideias de militante)?
...

Adorei os momentos finais dessa 2ª parte, essa reviravolta em que ele finalmente se percebe útil por ter prendido o policial, algo que nunca conseguiu com o seu passado, do qual se orgulhava muito. Mas, novamente não entendi o momento seguinte: o colega que falou que o jornal criminalizou o ato não sabia que era Armando quem tinha escrito o texto? Alguns colegas souberam e o olharam torto, mas alguns não sabiam?

E se o jornal tinha toda essa censura, como deixou passar a linha em que ele criticava o policial? Talvez as regras no jornal não sejam assim tão rígidas... Armando deve encarar o desafio, ganhar seu dinheiro e mostrar que tem o dom das palavras e que sabe usá-las a seu favor e a favor dos seus ideiais.

Parabéns pelo texto, Eraldo P.! :D

Unknown disse...

Amei o teu textO! Realmente leva jeito pra coisa hein? Recomendei a um amigo espero que ele também goste! :D
Tô meio distante da internet mas quando postar o próximo me avisa ok? Aguardando '-' beijão
http://loreenaprazeres.blogspot.com/

O Garoto do Blog. disse...

Aguardando...
bom domingo para vc amigo.

Sinceramente: O Garoto do Blog.

Eraldo Paulino disse...

Gente, muito obrigado pela visita de todos. Adoraria comentar cada comentário de vocês assim que postam, mas a verdade é que ainda estou com minha vida desorganizada demais pra isso.

De qualquer forma, saibam que adoro todos e todas.

Abraços!

Diogo Didier disse...

Tive que reler a primeira parte para acompanhar o desenrolar da história. Estou indo agora para o final. Ansioso!