Em muitas noites, quando crianças ou não, quiseram acordar de um pesadelo os dois gaúchos, mas noutros, como no vivido por eles agora, gostariam de não estar acordados, e sim dormindo sob o manto cosmopolita e subtropical do Rio Grande. Estavam diante da praga, mas não podiam bater ou correr simplesmente porque não sabiam se poderiam. Devido a iluminação de velas, os outros não poderiam ver o semblante de medo dos dois. Ele lembrou o que havia prometido a ela, mas conforme recordava não era no mesmo dia que se pagavam as dívidas prometidas à Matinta, e sim no dia posterior. E ainda assim, conforme lembra muito bem o gaúcho, seria uma velha a desgraçada a perturbar e não uma nova como aquela.
"Bom, como estamos todos estão apresentados, vamo lá pra beira do rio ver a noite passar, depois, quando tiverem pedindo arrego de tão cansados, vocês dois vão dormir aqui com a nossa anfitriã, pois lá na casa do trapiche não tem mais espaço pra atar rede", disse o amigo paraense aos gaúchos, mas a sulista logo disse da melhor forma como conseguiu disfarçar o desespero que não seria de bom tom eles ficarem lá, pois, pareceriam privilegiados perante os outros. O paraense tentou explicar que a razão, de fato, era a da ordem de chegada mesmo, pois quem chegou primeiro atou lá fora suas redes e, além do mais, a dona da casa odiaria ter de dormir só, e, quando soube da chegada de pessoas de outro estado, foi ela mesma quem pediu para se alojarem dentro da casa mesmo.
"Tá bom, a gente vai ficar aqui mesmo", disse calmamente o gaúcho. A gaúcha arregalou os olhos claros e ficou a imaginar que seu companheiro já estaria sob algum tipo de feitiço quando, percebendo instintivamente como ela o encarava, ele mexeu os lábios enquanto subia as sobrancelhas e disse sem precisar de voz: "CAL-MA". Para tomar aquela decisão, ele começou a imaginar que jamais houve qualquer história comprovada cientificamente. As lendas não eram apenas lendas, e, se aquele grupo já teria ido lá várias vezes e nunca aconteceu nada, ao ponto de sempre voltarem lá ano após ano, não seria só ficando com o cu na mão que entenderia aquele mistério. Depois de breve argumentação, ainda sob discreto protestos da moça, o casal de fora resolveu ficar ali dentro. A parceira conseguiu se acalmar um tantinho com a segurança passada a ela pelas palavras do agora destemido gaúcho. Depois do último "boa noite! Vamos deitar porque já estamos cansados", seguido de "nós vamos brincar de beber um pouco lá fora", agora eram só ele, ela e a Matinta na casa.
"Bom, como estamos todos estão apresentados, vamo lá pra beira do rio ver a noite passar, depois, quando tiverem pedindo arrego de tão cansados, vocês dois vão dormir aqui com a nossa anfitriã, pois lá na casa do trapiche não tem mais espaço pra atar rede", disse o amigo paraense aos gaúchos, mas a sulista logo disse da melhor forma como conseguiu disfarçar o desespero que não seria de bom tom eles ficarem lá, pois, pareceriam privilegiados perante os outros. O paraense tentou explicar que a razão, de fato, era a da ordem de chegada mesmo, pois quem chegou primeiro atou lá fora suas redes e, além do mais, a dona da casa odiaria ter de dormir só, e, quando soube da chegada de pessoas de outro estado, foi ela mesma quem pediu para se alojarem dentro da casa mesmo.
"Tá bom, a gente vai ficar aqui mesmo", disse calmamente o gaúcho. A gaúcha arregalou os olhos claros e ficou a imaginar que seu companheiro já estaria sob algum tipo de feitiço quando, percebendo instintivamente como ela o encarava, ele mexeu os lábios enquanto subia as sobrancelhas e disse sem precisar de voz: "CAL-MA". Para tomar aquela decisão, ele começou a imaginar que jamais houve qualquer história comprovada cientificamente. As lendas não eram apenas lendas, e, se aquele grupo já teria ido lá várias vezes e nunca aconteceu nada, ao ponto de sempre voltarem lá ano após ano, não seria só ficando com o cu na mão que entenderia aquele mistério. Depois de breve argumentação, ainda sob discreto protestos da moça, o casal de fora resolveu ficar ali dentro. A parceira conseguiu se acalmar um tantinho com a segurança passada a ela pelas palavras do agora destemido gaúcho. Depois do último "boa noite! Vamos deitar porque já estamos cansados", seguido de "nós vamos brincar de beber um pouco lá fora", agora eram só ele, ela e a Matinta na casa.
Foi tudo muito rápido. A porta bateu. A iluminação em todo o ambiente ficou completamente cinza. Ela se mijou mas não conseguiu se contorcer de vergonha. Os olhos dele arregalaram-se, mas não conseguiu gritar. A Matinta não se movia, mas ao mesmo tempo parecia estar em todos os lados; hora distante, hora encarando-os nariz a nariz, hora era um pássaro, hora era a jovem horripilante. Diferente do que aconteceu na mata, eram eles mesmos quem não se moviam. Tinham vontade de gritar, mas não conseguiam; tinham vontade de sair correndo mas as pernas estavam imóveis; tinham vontade até mesmo de pular no pescoço dela pra ver o que acontecia, mas nem isso. Estavam, acordados, vivendo um pesadelo, e o pior: não havia ninguém ali a não ser eles mesmos. Pior do que sentir o terror e o medo, é não conseguir externar tudo isso. Estavam presos num pesadelo alojado dentro de si.
De repente, tudo o que era cinza, passou a ficar absolutamente escuro. E no breu total, ele recuperou os movimentos. "Eu poderia comer os dois aqui e agora, mas não. Vou comer só essa branquinha aí, só pra ela deixar da pavulagem dela", sussurrou a Matinta ao ouvido do forasteiro. Ele, que havia lido sobre a "lenda" mas jamais leu ou entendeu o porquê de temerem-na tanto, agora não conseguia responder nada. Ele esperava resolver aquilo com a razão, mas não há razão sem experimentação, sem certeza previamente testada, e aquele momento era absoluta e aterradoramente inédito. Mesmo tremendo, só conseguiu foi sussurrar, não porque queria falar baixo mas porque só foi possível emitir aquele tanto de voz: "Tenho como te arranjar tabaco agora". Conseguiu ainda pedir, para a criatura deixá-la em paz e levá-lo no lugar. Mas ela somente começou a assobiar como resposta. Todo o breu começou a ser salpicado por pequenos mas constantes flashes de luz. O assobio aumentava, o vento também, os flashes seguiam o mesmo ritmo, e agora ele é quem gritava, dessa vez com a permissão da Matinta. Súbito os flashes pararam, e ainda com a mesma intensidade de ventania e de assobios, ele viu a boca com dentes encavalados da Matinta crescer, alargar-se, dilatar-se até consumir toda a sua amiga gaúcha. Ele correu pra impedir, mas de repente toda aquela boca escancarada virou-se para ele. Ia engoli-lo...
O gaúcho acordou com a gaúcha chorando ao lado dele no mesmo colchonete. "Ela me engoliu", dizia ela com o rosto ensopado de lágrimas. "A mim também", pensava ele tentando consolá-la. Suavam frio. Se abraçaram. Eram por volta das seis da manhã. Depois de um tempo abraçados, passaram a ouvir o som dos punhos de uma rede reclamando por ter de balançar. Era um som constante e semelhante ao de uma porta sem lubrificação abrindo e fechando rapidamente. A garota arredou para trás. O coração dele esfriou de novo. Os dois deitaram e ficaram esperando os outros acordarem. De repente bateram muitas dúvidas nele. Aconteceu mesmo aquilo tudo na noite anterior? Como os amigos não ouviram os gritos? Por que não morreram? Como ele e a amiga lembravam a mesma coisa? Bater nela? matá-la? Fugir dali? "Eu não comi vocês porque não estava com fome, mas não prometam mais tabaco se não têm. Eu já fumei a maconha que vocês tinham aí e estou bem. Só nunca contem essa história a ninguém, a não ser como se fosse lenda", disse a voz entre entre idas e vindas daquela rede encardida.
___________________
* Antes de mais nada gostaria de dizer que amo gaúchos, conheço vários virtual e pessoalmente, e quando pensei em pessoas para ilustrar este conto, não tive dúvidas em por estes.
** A história é baseada em muitas histórias que ouvi a minha vida toda por aqui, e que, por incrível que pareça, adoraria tê-las vivido eu pessoalmente.
***Meu HD queimou, e estou temporariamente sem PC, por isso demorei a postar, e não tenho visitado vocês. Mas prometo que logo-logo volto a encher o saco de todos de blog em blog.
De repente, tudo o que era cinza, passou a ficar absolutamente escuro. E no breu total, ele recuperou os movimentos. "Eu poderia comer os dois aqui e agora, mas não. Vou comer só essa branquinha aí, só pra ela deixar da pavulagem dela", sussurrou a Matinta ao ouvido do forasteiro. Ele, que havia lido sobre a "lenda" mas jamais leu ou entendeu o porquê de temerem-na tanto, agora não conseguia responder nada. Ele esperava resolver aquilo com a razão, mas não há razão sem experimentação, sem certeza previamente testada, e aquele momento era absoluta e aterradoramente inédito. Mesmo tremendo, só conseguiu foi sussurrar, não porque queria falar baixo mas porque só foi possível emitir aquele tanto de voz: "Tenho como te arranjar tabaco agora". Conseguiu ainda pedir, para a criatura deixá-la em paz e levá-lo no lugar. Mas ela somente começou a assobiar como resposta. Todo o breu começou a ser salpicado por pequenos mas constantes flashes de luz. O assobio aumentava, o vento também, os flashes seguiam o mesmo ritmo, e agora ele é quem gritava, dessa vez com a permissão da Matinta. Súbito os flashes pararam, e ainda com a mesma intensidade de ventania e de assobios, ele viu a boca com dentes encavalados da Matinta crescer, alargar-se, dilatar-se até consumir toda a sua amiga gaúcha. Ele correu pra impedir, mas de repente toda aquela boca escancarada virou-se para ele. Ia engoli-lo...
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O gaúcho acordou com a gaúcha chorando ao lado dele no mesmo colchonete. "Ela me engoliu", dizia ela com o rosto ensopado de lágrimas. "A mim também", pensava ele tentando consolá-la. Suavam frio. Se abraçaram. Eram por volta das seis da manhã. Depois de um tempo abraçados, passaram a ouvir o som dos punhos de uma rede reclamando por ter de balançar. Era um som constante e semelhante ao de uma porta sem lubrificação abrindo e fechando rapidamente. A garota arredou para trás. O coração dele esfriou de novo. Os dois deitaram e ficaram esperando os outros acordarem. De repente bateram muitas dúvidas nele. Aconteceu mesmo aquilo tudo na noite anterior? Como os amigos não ouviram os gritos? Por que não morreram? Como ele e a amiga lembravam a mesma coisa? Bater nela? matá-la? Fugir dali? "Eu não comi vocês porque não estava com fome, mas não prometam mais tabaco se não têm. Eu já fumei a maconha que vocês tinham aí e estou bem. Só nunca contem essa história a ninguém, a não ser como se fosse lenda", disse a voz entre entre idas e vindas daquela rede encardida.
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* Antes de mais nada gostaria de dizer que amo gaúchos, conheço vários virtual e pessoalmente, e quando pensei em pessoas para ilustrar este conto, não tive dúvidas em por estes.
** A história é baseada em muitas histórias que ouvi a minha vida toda por aqui, e que, por incrível que pareça, adoraria tê-las vivido eu pessoalmente.
***Meu HD queimou, e estou temporariamente sem PC, por isso demorei a postar, e não tenho visitado vocês. Mas prometo que logo-logo volto a encher o saco de todos de blog em blog.
8 comentários:
Nuss, que loko. Amei. Quanto ao PC, nem se preocupe, voc nao é o unico, o meu queimou a fonte e nao tem data pra voltar ao normal... É horrivel =[
Mas, fazer oqe neh?
Beijão.
Bah, guri, quando imaginei cá comigo a tal bocona engolindo a gaúcha pensei: tanta coisa melhor pra se fazer com uma gaúcha heim, que desperdício! Mas ainda bem que era só algum tipo de miragem ou ilusão...
Gostei da tua estória, mas não penses tu que estás livre de uma hora ou outra ler lá no Nota Preta alguma coisa sobre paraenses em apuros no Rio Grande do Sul! hehe
Um abraço! Feliz Natal!
Shoow, shoooW!! rs...
Vc é simplesmente incrível!!^^
Espero que conserte logo o pc, querido!!^^
Beijos e beijos pra ti!^^
Super hiper mega inteligente e deliciosamente fantástico...
bjux
;-)
Já estava ficando brava com sua ausência.
Espero que volte logo!
Novelinha assustadora.
Boas Festas, querido!
Bj♥
Aff, maior melda ficar sem o PC, mas ficou realmente interessante a história, sendo que eu pensaria que se trataria de uma alucinação causada por alguma erva venenosa...
Mas como está no post, há mais do que podemos crer devido ao nosso diploma do conhecimento dos homens.
E feliz natal Erado (mesmo que um pouco atrasado).
Fique com Deus, menino Eraldo.
Um abraço.
Passei por aqui para desejar um Ano Novo cheio de conquistas,saúde, paz, ótimas postagens como esta!!!
Bjs
Olá, Eraldo. Como vai? Primeiramente, claro, eu lhe devo desculpas por um retorno tão tardio, e cá elas estão. Agradeço imensamente a indicação que eu recebi de você há um tempo atrás, me fez muito feliz, viu? Por estar viajando e ter tido tempo e oportunidade apenas para postar rapidamente, não pude, naquela ocasião, agradece-lo devidamente. Segundo, vim lhe desejar meus votos de que o próximo ano venha com bons ares para você, trazendo-lhe prosperidade, certo?
Um grande abraço!
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